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Especial
Deus que os perdoe Conheça os padres brasileiros que romperam
com os votos de celibato, pobreza e obediência ao Papa
para seguir novos destinos, longe da religião e próximos
do pecado
Carlos Henrique Ramos
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Leandro Pimentel |
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Nome: Roque Rauber
Ordenação:
1967 Abandono:
1970 Profissão: proprietário
de uma boate de troca de casais em Porto Alegre,
já administrou farmácia, restaurante e agência
de
casamento | |
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“Na minha boate, as pessoas podem olhar com
os olhinhos, com os dedinhos, com os beicinhos,
mas há respeito. Ninguém é obrigado a fazer nada”,
diz o padre Roque
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A missa era o programa dominical preferido de
Roque Rauber. Compenetrado, acompanhava a liturgia sem
piscar os olhos. Aos 7 anos, decidiu ser padre. O menino
deixou Bom Princípio, no Rio Grande do Sul, e assumiu a
carreira eclesiástica. Trancafiou-se no seminário e
cursou Teologia em Burgos, na Espanha. Ordenou-se
sacerdote e perdeu a conta do número de casamentos e
batizados que celebrou nas paróquias Medianeira e Santa
Terezinha, ambas em Porto Alegre. No início da década de
70, porém, a tentação dominou seu espírito. Desiludido
com o rigor da Igreja Católica e sentindo-se culpado
pela manifestação da libido sob a batina, largou o
ministério sacerdotal. O homem que pretendia disseminar
a pureza entre os fiéis subverteu o destino que havia
traçado na infância. E mudou de ramo. Hoje em dia,
sobrevive dos prazeres da carne. Aos 59 anos, ele é
proprietário de uma boate na capital gaúcha. Um lugar
reservado a encontros eróticos de casais, mas que também
admite pessoas sozinhas. “Sigo semeando o bem, continuo
fiel aos princípios éticos e morais. Tenho orgulho do
que faço”, afirma.
Esse empresário da noite sepultou sua vocação
religiosa para erguer o Sofazão. Inaugurado em 1994, o
santuário do padre Roque é decorado com largos colchões
em forma de sofá. É ali que os casais vivem cenas
tórridas. Nas paredes, coraçõezinhos cravados pela
flecha de um cupido. Os recantos mais disputados são a
gaiola envidraçada e o confessionário – de onde só
escutam murmúrios. A partir das 22 horas, os shows são
protagonizados por homens e mulheres que, aos poucos,
despem-se para vivenciar fantasias. Sexta e sábado, dias
de maior movimento, a boate chega a receber 200 pessoas.
O sacerdote é o mestre de cerimônias. É ele quem promove
as brincadeiras e inflama os clientes. A seu lado,
trabalhando como sua assessora, está Janete, sua mulher.
É o terceiro casamento do padre. Os dois se conheceram
lá. “Aqui as pessoas podem olhar com os olhinhos, com os
dedinhos, com os beicinhos, mas há respeito”, garante.
“Ninguém é obrigado a fazer nada, não é um vale tudo. A
sinceridade é um traço que cultivo desde a época do
seminário.”
Roque Rauber é um dos muitos religiosos
brasileiros que largaram a batina para romper com os
votos de castidade, pobreza e obediência ao Papa. No
Brasil, vivem cerca de 12,6 mil sacerdotes e outros 8
mil casados. Pelo Direito Canônico, no entanto, eles
continuam sendo padres – a ordenação é um sacramento que
não pode ser desfeito, como o batismo. Mas, ao virarem
as costas para os juramentos cristãos, esses homens
casaram, juntaram dinheiro e tornaram-se presas dos
prazeres mundanos. Como simples homens, derraparam nos
sete pecados capitais. “Jamais fiz o mal para alguém”,
completa o empresário, que, após o trabalho, de
madrugada, deita-se na cama com Janete para alguns
minutos de reflexão. “Não somos só animais carnais.”
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